Escolas públicas no DF voltam às aulas presenciais com separação entre 'moças' e 'rapazes'; Centro de Direitos Humanos questiona segregação

Pelo menos dois colégios organizaram retorno híbrido com revezamento entre alunas e alunos. Direção de uma das escolas cita necessidade das mães para que filhas cuidem dos irmãos em casa; Secretaria de Educação anuncia que haverá mudanças. Estudante mede temperatura na entrada de escola pública no Paranoá (DF) Luiza Garonce/G1 Pelo menos duas escolas públicas do Distrito Federal organizaram o retorno às aulas presenciais com a separação de alunos por gênero. Nos colégios que aderiram ao modelo, "meninas/moças" frequentam as aulas em uma semana, e, na outra, as atividades são exclusivas para "meninos/rapazes". LEIA TAMBÉM: VOLTA ÀS AULAS: especialistas explicam em 10 pontos como fazer um retorno mais seguro 'ENSINO HÍBRIDO É MEDIDA PALIATIVA': pesquisadores preveem sobrecarrega de professores e defasagem na aprendizagem CALENDÁRIO: vela cronograma de volta às aulas presenciais das escolas públicas do DF A medida está em um comunicado ao qual o G1 teve acesso (veja imagem abaixo), enviado às famílias dos estudantes do Centro Educacional do Lago Norte (Cedlan) e do Centro de Ensino Lago Norte (Celan). Os colégios atendem alunos dos ensinos fundamental e médio e também da Educação de Jovens e Adultos (EJA). A Secretaria de Educação diz que as unidades da rede pública "possuem autonomia para tomada de decisões, princípio básico da gestão democrática", no entanto, anunciou mudanças no modelo adotado pelas escolas do Lago Norte (veja mais abaixo). Já o Centro Brasiliense de Defesa dos Direitos Humanos (Centrodh) protocolou um ofício no Ministério Público (MPDFT) para que a medida seja repensada "por causa do formato adotado, considerado segregação de gênero e causador de constrangimentos". Comunicado de volta às aulas em colégio público do Lago Norte, em Brasília Reprodução "A prática pode causar constrangimento e desconforto em alunos que não se encaixam nesse padrão pré-determinado", aponta trecho do documento entregue ao MPDFT. “O público mais afetado mais uma vez são jovens LGBTQIA+, os não binários, que neste caso, não teriam dias para irem à escola, assim como os indivíduos transexuais", diz documento. Meninas em casa Ao G1, a direção do CELAN disse que o formato foi escolhido "a pedido das famílias". Uma servidora, que preferiu não se identificar, explicou que a pouca oferta de ônibus para o transporte escolar, e a necessidade de algumas mães, motivaram a decisão de separar meninas e meninos durante as aulas presenciais. "As famílias precisam que as filhas estejam em casa por algumas semanas para cuidar dos irmãos menores. Muitas mães trabalham fora e precisam delas [alunas], por isso, a ida à escola precisava ser intercalada”, disse a funcionário do CELAN. Número de estagiários que ajudam no sustento da família cresceu durante pandemia, diz pesquisa Mulheres do DF sofrem mais com desemprego e cargos precários, diz estudo Além disso, a servidora explicou que o colégio tem cerca de 700 alunos matriculados, do 6º ao 9º ano e, ainda assim, "apenas nove ônibus fazem o transporte desses alunos", com a capacidade reduzida, devido à pandemia de Covid-19. “É uma questão de organização da direção do colégio, nesse primeiro momento. Não tem nada a ver com segregação de gênero”, disse. Ilustração mostra jovens em escola Amelia Flower @ameliaflower A direção do Centro Educacional do Lago Norte (Cedlan) não quis se posicionar sobre o assunto. No entanto, após o repercussão do caso, o colégio enviou um comunicado às famílias dos alunos informando sobre mudanças no modelo híbrido. A partir da próxima segunda-feira (30), a aulas passam a ser organizadas por ordem alfabética, de acordo com os nomes dos alunos. "Após uma ótima semana de acolhimento e adaptação, a direção do CEDLAN decidiu modificar o revezamento dos grupos. A partir da semana que vem, iniciaremos a Semana 1 do revezamento na qual os grupos serão divididos por ordem alfabética do primeiro nome do estudante", diz o novocomunicado. A Secretaria de Educação também informou que o Centro de Ensino Lago Norte, "já no decorrer de setembro, mesclará os grupos". Em relação ao Centro Educacional Lago Norte (Cedlan), a escolha de separar moças e rapazes foi feita com a participação da comunidade escolar, apenas para a primeira semana de aula presencial. "Os grupos já estarão compostos com os dois gêneros já na próxima semana", diz a secretaria. O G1 também procurou o Ministério Público para comentar a decisão dos colégios e saber sobre as medidas que serão adotadas, mas aguardava resposta até a publicação desta reportagem. Alunos do 1° ao 5° ano voltam às aulas na rede pública de ensino do DF Camila Guimarães/TV Globo Pedidos No ofício entregue ao Núcleo de Enfrentamento à Discriminação do MPDFT, o Centro de Direitos Humanos também pontuou que o formato de separação por gênero na volta às aulas "fomenta o preconceito e a discriminação". Ao Ministério Público, a entidade fez o seguintes pedidos: Reunião com as escolas para mediar a busca de soluções, Abert

Escolas públicas no DF voltam às aulas presenciais com separação entre 'moças' e 'rapazes'; Centro de Direitos Humanos questiona segregação

Pelo menos dois colégios organizaram retorno híbrido com revezamento entre alunas e alunos. Direção de uma das escolas cita necessidade das mães para que filhas cuidem dos irmãos em casa; Secretaria de Educação anuncia que haverá mudanças. Estudante mede temperatura na entrada de escola pública no Paranoá (DF) Luiza Garonce/G1 Pelo menos duas escolas públicas do Distrito Federal organizaram o retorno às aulas presenciais com a separação de alunos por gênero. Nos colégios que aderiram ao modelo, "meninas/moças" frequentam as aulas em uma semana, e, na outra, as atividades são exclusivas para "meninos/rapazes". LEIA TAMBÉM: VOLTA ÀS AULAS: especialistas explicam em 10 pontos como fazer um retorno mais seguro 'ENSINO HÍBRIDO É MEDIDA PALIATIVA': pesquisadores preveem sobrecarrega de professores e defasagem na aprendizagem CALENDÁRIO: vela cronograma de volta às aulas presenciais das escolas públicas do DF A medida está em um comunicado ao qual o G1 teve acesso (veja imagem abaixo), enviado às famílias dos estudantes do Centro Educacional do Lago Norte (Cedlan) e do Centro de Ensino Lago Norte (Celan). Os colégios atendem alunos dos ensinos fundamental e médio e também da Educação de Jovens e Adultos (EJA). A Secretaria de Educação diz que as unidades da rede pública "possuem autonomia para tomada de decisões, princípio básico da gestão democrática", no entanto, anunciou mudanças no modelo adotado pelas escolas do Lago Norte (veja mais abaixo). Já o Centro Brasiliense de Defesa dos Direitos Humanos (Centrodh) protocolou um ofício no Ministério Público (MPDFT) para que a medida seja repensada "por causa do formato adotado, considerado segregação de gênero e causador de constrangimentos". Comunicado de volta às aulas em colégio público do Lago Norte, em Brasília Reprodução "A prática pode causar constrangimento e desconforto em alunos que não se encaixam nesse padrão pré-determinado", aponta trecho do documento entregue ao MPDFT. “O público mais afetado mais uma vez são jovens LGBTQIA+, os não binários, que neste caso, não teriam dias para irem à escola, assim como os indivíduos transexuais", diz documento. Meninas em casa Ao G1, a direção do CELAN disse que o formato foi escolhido "a pedido das famílias". Uma servidora, que preferiu não se identificar, explicou que a pouca oferta de ônibus para o transporte escolar, e a necessidade de algumas mães, motivaram a decisão de separar meninas e meninos durante as aulas presenciais. "As famílias precisam que as filhas estejam em casa por algumas semanas para cuidar dos irmãos menores. Muitas mães trabalham fora e precisam delas [alunas], por isso, a ida à escola precisava ser intercalada”, disse a funcionário do CELAN. Número de estagiários que ajudam no sustento da família cresceu durante pandemia, diz pesquisa Mulheres do DF sofrem mais com desemprego e cargos precários, diz estudo Além disso, a servidora explicou que o colégio tem cerca de 700 alunos matriculados, do 6º ao 9º ano e, ainda assim, "apenas nove ônibus fazem o transporte desses alunos", com a capacidade reduzida, devido à pandemia de Covid-19. “É uma questão de organização da direção do colégio, nesse primeiro momento. Não tem nada a ver com segregação de gênero”, disse. Ilustração mostra jovens em escola Amelia Flower @ameliaflower A direção do Centro Educacional do Lago Norte (Cedlan) não quis se posicionar sobre o assunto. No entanto, após o repercussão do caso, o colégio enviou um comunicado às famílias dos alunos informando sobre mudanças no modelo híbrido. A partir da próxima segunda-feira (30), a aulas passam a ser organizadas por ordem alfabética, de acordo com os nomes dos alunos. "Após uma ótima semana de acolhimento e adaptação, a direção do CEDLAN decidiu modificar o revezamento dos grupos. A partir da semana que vem, iniciaremos a Semana 1 do revezamento na qual os grupos serão divididos por ordem alfabética do primeiro nome do estudante", diz o novocomunicado. A Secretaria de Educação também informou que o Centro de Ensino Lago Norte, "já no decorrer de setembro, mesclará os grupos". Em relação ao Centro Educacional Lago Norte (Cedlan), a escolha de separar moças e rapazes foi feita com a participação da comunidade escolar, apenas para a primeira semana de aula presencial. "Os grupos já estarão compostos com os dois gêneros já na próxima semana", diz a secretaria. O G1 também procurou o Ministério Público para comentar a decisão dos colégios e saber sobre as medidas que serão adotadas, mas aguardava resposta até a publicação desta reportagem. Alunos do 1° ao 5° ano voltam às aulas na rede pública de ensino do DF Camila Guimarães/TV Globo Pedidos No ofício entregue ao Núcleo de Enfrentamento à Discriminação do MPDFT, o Centro de Direitos Humanos também pontuou que o formato de separação por gênero na volta às aulas "fomenta o preconceito e a discriminação". Ao Ministério Público, a entidade fez o seguintes pedidos: Reunião com as escolas para mediar a busca de soluções, Abertura de diálogo com a Secretaria de Educação para debates de modelo de educação mais inclusivos para jovens LGBTQIA+; Recomendação visando uma educação mais inclusiva e que respeite as pessoas LGBTQIA+ residentes no Distrito Federal. O presidente do Centro de Direitos Humanos, Michel Platini, diz que a entidade procurou o Ministério Público por considerar que "a escola deve ser espaço de acolhimento e inclusão". Segundo ele, "é inaceitável qualquer imposição de segregação e que promova constrangimentos para qualquer aluno". Modelo híbrido As aulas nas escolas públicas do DF para estudantes do ensino fundamental retornaram no dia 16 de agosto, no modelo híbrido. Alunos do ensino médio voltaram a frequentar a escola no último dia 23 de agosto. Desde então, os estudantes se revezam em grupos entre as atividades presenciais e remotas. Por causa da pandemia do novo coronavírus, a capacidade dos ônibus escolares oferecidos pela Secretaria de Educação também foi reduzida. Leia mais notícias sobre a região no G1 DF.